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Licenciamento ambiental fragilizado: escolhas que comprometem o futuro do Brasil

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    Frente Parlamentar Ambientalista
  • há 1 dia
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Retrocessos recentes na legislação e a criação da Licença Ambiental Especial enfraquecem salvaguardas essenciais, aumentam riscos socioambientais e contrariam compromissos climáticos assumidos pelo país

Por Clarissa Presotti*


Nas últimas semanas, o Brasil assistiu à derrubada da maior parte dos vetos presidenciais à Lei Geral do Licenciamento. Somada à aprovação da Medida Provisória que cria a Licença Ambiental Especial (LAE), ela representa um enfraquecimento estrutural do sistema responsável por prevenir danos socioambientais, proteger populações vulneráveis e assegurar que empreendimentos econômicos sejam compatíveis com o interesse público.


Trata-se de uma alteração que vai além de ajustes regulatórios. O que está em curso é a flexibilização de salvaguardas essenciais, com potenciais impactos sobre biomas estratégicos, regimes de chuva, disponibilidade de água, integridade de territórios e segurança climática.


O licenciamento ambiental existe para permitir que atividades econômicas se desenvolvam com responsabilidade, transparência, participação social e base técnica sólida. Ele identifica riscos, define condicionantes, estabelece monitoramento e orienta soluções que podem evitar tragédias humanas e ambientais. Quando o licenciamento ambiental é fragilizado, o custo recai sobre a sociedade.


É nesse contexto que a derrubada de vetos que preservavam salvaguardas históricas da Lei da Mata Atlântica gera preocupação. Hoje, restam pouco mais de 12% da cobertura original do bioma, distribuída em fragmentos que sustentam parte significativa do abastecimento urbano, da produção agrícola e do equilíbrio climático do país.


Flexibilizar as barreiras legais que protegem esses remanescentes significa expor mananciais, encostas, nascentes e rios a riscos iminentes de degradação, em um momento em que o Brasil já convive com eventos climáticos extremos recorrentes, como enchentes, estiagens severas e crises de abastecimento.


A aprovação da LAE aprofunda esse cenário ao reduzir etapas de análise, limitar o espaço de participação pública e enfraquecer a capacidade do Estado de avaliar impactos sociais e ambientais em sua totalidade. Em territórios frágeis ou em obras de grande porte, um processo simplificado não é sinônimo de eficiência. Ao contrário: significa menor rigor técnico, menos transparência e maior probabilidade de decisões condicionadas por interesses imediatos. Em um país marcado por episódios de colapso ambiental, desastres tecnológicos, degradação de rios e disputas territoriais, abrir mão de instrumentos preventivos é um risco institucional que não pode ser normalizado.


Os danos não são abstratos. Eles se manifestam na qualidade da água, na perda de biodiversidade, no agravamento de eventos extremos e na pressão crescente sobre ecossistemas que já operam no limite.


Do ponto de vista jurídico e institucional, recolocar em vigor dispositivos questionados por inconstitucionalidade produz incerteza, disputa e judicialização. Decisões que fragilizam o licenciamento desencorajam investimentos responsáveis e comprometem a credibilidade do país no cenário internacional, especialmente num momento em que o Brasil busca se reposicionar como liderança climática na sequência de compromissos assumidos na COP30.


Não há coerência entre defender metas de redução de emissões, proteção de florestas e resiliência climática no plano global e, internamente, enfraquecer os instrumentos que tornam esses compromissos viáveis.


É importante destacar que o licenciamento ambiental já dispõe de modalidades, prazos e procedimentos diferenciados para cada tipo de empreendimento. Ele pode — e deve — ser continuamente aperfeiçoado para tornar-se mais eficiente, célere e integrado. Mas o aperfeiçoamento não pode servir de justificativa para flexibilizações que reduzam a capacidade de prevenir danos, especialmente em áreas sensíveis. O Brasil tem ciência, instituições e sociedade civil atuantes para construir soluções equilibradas.


A agenda ambiental do país é a base de um modelo de desenvolvimento sustentável, justo e competitivo. Isso exige governança forte, transparência, estabilidade regulatória e salvaguardas capazes de proteger vidas, ecossistemas e o nosso patrimônio natural. Baixar a guarda do licenciamento é caminhar na direção oposta.


Nosso desafio não é escolher entre desenvolvimento ou proteção ambiental, mas garantir ambos. E isso começa por reconhecer que o licenciamento ambiental é uma garantia, não um obstáculo: de segurança, justiça climática e compromisso com um futuro verdadeiramente sustentável para o Brasil. Clarissa Presotti - especialista de Políticas Publicas do WWF-Brasil



Fonte: Correio Braziliense

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