O manejo florestal sustentável é um dos mecanismos mais eficazes para deter o desmatamento e atividades ilícitas, além de possibilitar a exploração econômica de muitos produtos, manutenção de serviços, geração de emprego e renda e riquezas para estados e municípios. A prática também gera aumento na arrecadação de impostos e segurança jurídica ao setor florestal, além de promover a conservação da biodiversidade local. É preciso, no entanto, ampliar as áreas de concessão florestal no país e incentivar os planos de manejo. A conclusão é dos expositores que participaram nesta quarta-feira (21) de audiência pública interativa na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) sobre o manejo florestal em área nativa no bioma amazônico e seus desafios.
O debate foi promovido por iniciativa do senador Jaime Bagattoli (PL-RO) e da senadora Soraya Thronicke (União-MS), que preside a CRA. Ex-motorista de caminhão e neto de madeireiro, Jaime Bagattoli contou que foi o primeiro a fazer um plano de manejo florestal na Amazônia, em 1987, e destacou a importância do mecanismo para a preservação ambiental e a economia, até mesmo das comunidades indígenas.
— Tem que aumentar as concessões, o plano de manejo sustentável é o caminho, é o único mecanismo de se preservar as florestas e terras da União que não vão ser destinadas a programa de reforma agrária. Não existe outro mecanismo, isso vai dar remuneração a todos — afirmou.
Na avaliação de Soraya Thronicke, é preciso acabar com as amarras ideológicas e promover o desenvolvimento do país.
— Os especialistas da audiência pública podem nos ajudar nas lacunas da legislação que ainda existem para crescermos na produção e melhorarmos as condições de exploração com muita responsabilidade — afirmou.
Áreas mapeadas
As concessões florestais, atualmente concentradas no Amapá, Pará e Rondônia, ainda representam muito pouco da produção florestal, ressaltaram debatedores. Hoje há cerca de 1,4 milhão de hectares sob concessão, mas existem áreas mapeadas que indicam a possibilidade de ampliação das concessões, o que aumentaria a participação do Brasil na parcela global de demanda de madeira. Estados Unidos, Europa e China são os maiores compradores da madeira brasileira.
— Temos mais de 450 milhões de hectares de floresta. No entanto, o Brasil representa apenas 6% do suprimento industrial de madeira. O restante vem de floresta plantada. O Brasil é o segundo país no mundo em extensão florestal, mas corresponde a parcela muito pequena do mercado mundial de madeira, o que demonstra que temos espaço para crescer, potencializar essa produção e participar de forma mais efetiva nesse mercado crescente — afirmou o diretor técnico da Associação Brasileira de Empresas Concessionárias Florestais (Confloresta) e representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Deryck Pantoja Martins.
O representante da Confloresta ressaltou que o manejo florestal é a melhor estratégia de conservação das florestas e da biodiversidade. A madeira, segundo ele, é o produto mais rastreável da economia rural dentre os principais produtos da balança comercial, por meio de sistema altamente eficaz que permite garantir que o produto é originário de floresta licenciada devidamente autorizada pelos órgãos competentes, a partir de plataforma de sistemas públicos acessíveis a qualquer cidadão de forma efetiva.
— Menos de 5% do suprimento de madeira vem das concessões florestais, e a gente ainda tem grande parte das áreas privadas. Um dos grandes desafios é que a gente consiga ampliar as concessões florestais. Se nós conseguirmos chegar a 20 milhões de hectares em concessão de florestas, a gente vai aumentar em R$ 3,3 bilhões o PIB [produto interno brasileiro], uma arrecadação de impostos da ordem de R$ 250 milhões, um impacto positivo superior a R$ 85 milhões, a geração de mais de 170 mil empregos, um valor da produção em 2030 equivalente a R$ 6,3 bilhões, um potencial de receita projetado em R$ 357 milhões — afirmou Derick.
Dentre os principais desafios do Brasil no setor, segundo Derick, estão a atuação nos mercados externo e interno; a substituição da madeira por plástico e gesso; os ataques deliberados ao produto madeira, associada a desmatamento; o acesso ao crédito; a reestruturação e fortalecimento dos órgãos ambientais; a sistematização dos processos autorizativos; e a garantia de fiscalização no campo.
Derick sugeriu ainda a ampliação da atividade e a simplificação da gestão florestal; o uso de tecnologias e formas inteligentes de monitoramento já existentes; a garantia de segurança jurídica às concessões florestais; incentivos à produção florestal por meio de compras públicas e programas de casas populares; a diversificação da produção madeireira; e a promoção do produto madeira no Brasil e no mundo.
Desinformação
Presidente do Fórum Nacional das Atividades de Base Florestal (FNBF), Frank Rogieri de Souza Almeida ressaltou que é preciso combater a desinformação e a “ideologia desenfreada” que se implantou no Brasil e a discriminação de certos setores da economia.
O setor de base florestal é hoje um dos maiores vetores de preservação ambiental e de conservação de florestas que o Brasil e o mundo têm disponível, ressaltou. Ele disse ainda que as concessões vêm crescendo, são feitas com maestria e levam opção de geração de renda, emprego e arrecadação de impostos a locais antes inóspitos da Amazônia brasileira.
Almeida destacou ainda que o manejo florestal combate o aquecimento global, contribui para a construção civil, gera emprego e leva dignidade e opção de renda aos povos amazônicos. Como exemplo, citou projeto de manejo florestal implantado em Altamira (PA), em 2013, que vem contribuindo para o desenvolvimento da população local. Essa experiência, afirmou, “precisa ser olhada com outros olhos, para combater a discriminação e mostrar ao Brasil que podemos avançar mais”.
— Desde que foi assinado, [o projeto na floresta de Altamira] não tem um foco de incêndio. Gera-se muito emprego para as mulheres, que produzem [cabos e produtos de madeira] para uma grande empresa brasileira. O manejo florestal é uma opção não só para a Amazônia, mas para todo o Brasil — afirmou.
Florestas públicas
Diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), Garo Joseph Batmanian defendeu a aceleração do processo de concessão de florestas e fez questão de esclarecer que manejo florestal sustentável não é sinônimo de desmatamento.
— Temos que reforçar essa mensagem. O corte seletivo pode ser manejo sustentável, mas pode ser predatório. Na floresta sob concessão tudo tem que seguir a lei. O serviço florestal trabalha primeiramente com florestas públicas dentro das florestas nacionais do Brasil, que são unidades de conservação gerenciadas pelo ICMBio. Cada uma com área destinada a plano de manejo, todas no momento na Amazônia; 1,2 milhão de hectares de florestas concessionadas no momento, 21 contratos vigentes em 7 florestas, com 14 em produção em cinco Flonas [florestas nacionais]. Até o momento já geraram 2 milhões de metros cúbicos de madeira em tora — explicou.
Além de afirmar que o manejo florestal, mesmo em terras privadas, gera emprego e renda, especialmente em lugares pobres, Garo falou dos recursos repassados ao governo pelos concessionários.
— Foram arrecadados R$ 31 milhões; 13% cento vão para o município, 13% para o estado da concessão, 25% para o ICMBio e 36% para o Serviço Florestal Brasileiro. Existe contribuição efetiva para estados e municípios que têm concessão de Flonas em seus limites territoriais, que podem gerar emprego e renda à população carente. Queremos garantir que a madeira explorada nas concessões possa ser monitorada. Criamos sistema robusto de rastreamento da madeira que sai das concessões para garantir que ela seja bem utilizada. As 21 concessões já feitas em cinco Flonas já em operação geraram 1.684 empregos diretos e mais de 3 mil indiretos, com carteira assinada e outras garantias — afirmou.
Cadeia produtiva
Diretora de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Lívia Karina Passos Martins disse que o manejo florestal incentiva a redução das mudanças climáticas, uma vez que toda a cadeia produtiva preserva e protege a floresta.
— O Ibama tem feito esforço grande para ajudar a qualificar o produto comerciado na cadeia de base florestal. É difícil o empresário sério da concessão florestal competir com a madeira que está sendo acobertada por créditos irregulares, com trabalho degradante e exploração da pobreza do entorno, com empresas fantasmas envolvidas e documentos fraudados. Isso não pode estar associado à cadeia de base legal. Reconhecemos a importância da rastreabilidade da madeira; somos competitivos, tanto no mercado interno e externo, e a qualidade dos produtos é bastante exigida, não existe mais uma lógica de continuar contaminando a cadeia produtiva de base florestal com irregularidades já conhecidas. Estamos diante de nova ética de sustentabilidade — afirmou.
Bioeconomia
Ao comentar a fala da representante do Ibama, o senador Jayme Campos (União-MT) citou projeto de autoria dele que prioriza a destinação de recursos de fundos ambientais climáticos para projetos e iniciativas da bioeconomia. Segundo ele, o PL 1.162/2023, em tramitação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), é um primeiro passo para amplificar e alavancar o empreendedorismo verde e contribuir para a preservação e proteção da biodiversidade da floresta. A bioeconomia é uma forma moderna de conciliar produção, geração de emprego e a preservação do meio ambiente, podendo, de acordo com a Embrapa, gerar faturamento da ordem de US$ 284 bilhões até 2050, destacou o senador.
Em resposta a Jayme Campos, Lívia disse que a aprovação do projeto seria “uma excelente ideia", porque não adianta proteger a Amazônia sem levar em consideração a questão de combate a fome e a pobreza.
— O país, apesar de rico em termos de biodiversidade, ainda tem população à margem da pobreza, e esses projetos seriam excepcionais para tirar esse pessoal do trabalho degradante. Se não conseguirmos trazer esse pessoal para os trabalhos da bioeconomia, continuaremos a dar a ele incentivos para se desenvolver na ilegalidade, como a venda de seus CPFs para esquemas criminosos — afirmou.
Jayme Campos cobrou ainda mais agilidade do governo para ampliar o programa de concessão florestal. Em sua avaliação, o resultado financeiro das concessões, embora positivo, ainda é muito insignificante diante do tamanho do território brasileiro.
— Na Amazônia vivem 28 milhões de brasileiros, muitos em condições subumanas. Se não tiver política pública bem definida, desmatamento ilegal sempre vai ter. O governo tem que ser mais célere em suas ações, haja vista que temos capacidade de concessionar de mais 20 milhões de hectares de terra, e não anda — afirmou.
“Gigantismo”
Ex-ministra da Agricultura, a senadora Tereza Cristina (PP-MS) disse que o manejo florestal sustentável é uma ferramenta que contribui para deter o desmatamento ilegal em terras públicas.
— Esse é um programa que deve ser olhado com muito carinho pelo Ministério do Meio Ambiente, pelo Ibama, e que ele seja mais célere, talvez com lotes menores, não sei, para que a gente possa utilizar essas terras não destinadas e tenha alguém cuidando. O Brasil tem um problema muito sério, que é o nosso gigantismo, nós somos um continente, tudo aqui e complicado pelo nosso tamanho. O Brasil vive um bom momento, mas a gente precisa caminhar — afirmou.
Tereza Cristina observou que o manejo sustentável em florestas nativas é uma atividade de fundamental relevância não só no âmbito do ambiente amazônico, mas em todo o país, tendo em vista a existência de áreas legais e de preservação permanente que podem ser exploradas. Todavia, afirmou, a constante “demonização” da atividade produtiva no meio rural por setores radicais e movimentos fundamentalistas contribui para a criação de um ambiente institucional que dificulta demasiadamente a aprovação dos planos de manejo florestal, especialmente para aqueles produtores familiares e associações comunitárias que não têm condições de contratar assessorias especializadas para a elaboração dos planos.
— Precisamos avançar com o pagamento por serviços ambientais, pois essa é uma ferramenta que traria harmonia e conciliação entre ambientalistas e produtores rurais — concluiu.
Fonte: Agência Senado
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